Receita Federal publica portaria regulamentando a transação de débitos tributários

Após uma longa espera, enfim a Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria nº 208, de 12/08/2022, disciplinando os procedimentos, os requisitos e as condições necessárias à realização da transação dos débitos tributários sob a sua administração.

Até então, apenas a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – PGFN havia regulamentado a transação na esfera federal, a qual abrange a negociação de débitos inscritos em dívida ativa. Tanto a Portaria da RFB como a da PGFN regulamentam a recente lei 14.375/2022, que alterou as normas da transação tributária originalmente instituídas na 13.988/2020.

A nova lei ampliou de 50% para 65% o desconto máximo permitido na transação tributária, ampliou de 84 para 120 o número máximo de parcelas e, além disso, permitiu o uso de prejuízo fiscal e base negativa da CSLL para compensação de até 70% do valor total do débito, após os descontos.

Lembre-se que, na hipótese de transação que envolva pessoa natural, inclusive Microempreendedor Individual (MEI), Microempresa (ME) ou Empresa de Pequeno Porte (EPP), a Portaria mantém o texto original da Lei nº 13.988/2020, pelo qual a redução máxima em multas e juros será de até 70% (setenta por cento), e o prazo máximo de quitação é de até 145 meses, com exceção dos débitos previdenciários, para os quais o prazo é limitado a 60 meses, por imposição do § 11 do art. 195 da Constituição Federal.

A Portaria 208 estabelece, dentre outras disposições, que:

1) As modalidades de transação dos créditos tributários em contencioso administrativo fiscal, sob a administração da RFB, são as seguintes:

  1. a) Transação por adesão à proposta da RFB;
  2. b) Transação individual proposta pela RFB; e
  3. c) Transação individual proposta pelo contribuinte.

A definição de “contencioso” envolve o débito na pendência de petições e dos recursos previstos nos Decretos 70.235/72 e 7.574/11 e na Lei 9.784/99, que são as normas que regulam o contencioso fiscal administrativo.

Os critérios para a transação individual e individual simplificada, que são modalidades em que o contribuinte pode propor a negociação do débito ao fisco, são os mesmos adotados pelas normas da PGFN. A “transação individual” abrange débitos a partir de R$ 10 milhões, e a “transação individual simplificada” vale para os débitos de R$ 1 milhão a R$ 10 milhões.

Por sua vez, os contribuintes com débitos abaixo de R$ 1 milhão poderão participar da modalidade “por adesão”, ou seja, poderão aderir quando a própria Receita publicar edital de transação. Assim, para esta opção, será necessário aguardar a publicação do referido edital, o que, espera-se, deva ocorrer ainda este mês.

A Portaria estabelece que o sujeito passivo poderá transacionar o débito na pendência da impugnação perante as delegacias de julgamento (DRJs) ou mesmo do recurso perante o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

2) Estas modalidades de transação poderão envolver, a exclusivo critério da RFB, o pagamento de entrada mínima como condição à adesão e a manutenção dos arrolamentos e demais garantias associadas aos débitos transacionados, quando a transação envolver parcelamento, moratória ou diferimento.

3) Enquanto a proposta de transação não estiver concretizada pelo contribuinte e aceita pela RFB, em quaisquer das modalidades previstas na Portaria, não haverá suspensão da exigibilidade dos respectivos créditos tributários.

4) O sujeito passivo será informado da metodologia de cálculo e das demais informações utilizadas para mensuração da sua capacidade de pagamento por meio do e-CAC, disponível no endereço eletrônico http://www.gov.br/receitafederal/pt-br.

5) Após a incidência dos descontos ajustados, se houver, será admitida, a exclusivo critério da RFB, a liquidação de até 70% (setenta por cento) do saldo remanescente com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL.

Nesse ponto, verifica-se que a regulamentação da RFB não prevê as restrições da Portaria 6.941/2022, da PGFN, a qual limitou o uso do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL a débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação, não sendo possível sua utilização na transação por adesão e individual simplificada. Por outro lado, a Portaria da RFB dispõe que a autorização para uso dos créditos ficará a critério exclusivo do fisco.

6) O sujeito passivo poderá apresentar, no prazo de 10 dias, contado da data da notificação da recusa, recurso administrativo da decisão que recusar a proposta de transação individual.

7) O devedor poderá utilizar créditos líquidos e certos em desfavor da União, reconhecidos em decisão judicial transitada em julgado, ou precatórios federais, próprios ou de terceiros, para amortizar ou liquidar saldo devedor transacionado.

8) As transações firmadas pela RFB observarão, no que couber, os critérios de capacidade de pagamento definida nos termos do Capítulo II da Portaria PGFN nº 9.917/2020, competindo à Procuradoria-Geral Adjunta de Gestão da DAU e do FGTS o fornecimento dos dados necessários para esse fim, até a entrada em vigor do Capítulo II da Portaria PGFN nº 6.757/2022.

Em conclusão, pode-se afirmar que a avaliação da portaria é positiva, especialmente pelo fato de que não contém as restrições contidas na portaria da PGFN sobre a utilização dos créditos de prejuízo fiscal e de base negativa da CSLL. Registre-se, inclusive, que estas restrições não constam da Lei nº 14.375/2022, o que autoriza o seu eventual questionamento em medida judicial.

A Portaria entra em vigor em 01 de setembro de 2022, com exceção do seu Capítulo VI, o qual trata da “Transação individual simplificada”, o qual entra em vigor em 01 de janeiro de 2023.